A escola para todos, concretizada após a transição para a democracia, tem uma história de sucesso. Portugal tinha, em 1974, um quarto da população analfabeta, uma taxa residual de jovens no ensino secundário e no ensino superior. Um défice de qualificações com impactos no desenvolvimento humano, na economia, no acesso a emprego com consequências que ainda hoje se fazem sentir.
Estas consequências verificam-se não só ao nível da escolarização e do mercado de emprego como também no fraco exercício consciente e permanente de uma cidadania, informada e comprometida com os valores democráticos.
A democratização do ensino garantiu o acesso a educação para todos, num caminho progressivo, incremental e com evidências notáveis, apesar dos ataques sucessivos à reputação do serviço público de educação. A escola pública tem assumido, ao longo dos 50 anos de construção da democracia, um papel fundamental na melhoria da vida dos cidadãos através da qualificação e do acesso à educação e da promoção do sucesso educativo, quebrando ciclos de pobreza e exclusão. A inscrição curricular de disciplinas na área da Cidadania é alvo de ataque dos partidos de direita, sobretudo quando os temas em debate visam promover a igualdade de género, o esclarecimento e formação sobre educação sexual ou fomentar o diálogo inter e multicultural.
Há, contudo, muito caminho a percorrer no cumprimento pleno dos objetivos da escola democrática. Garantir a igualdade de acesso não significou garantir a igualdade de sucesso. O desafio da inclusão plena é ainda o principal. Em todos os países, mas em Portugal de forma agravada, a condição socioeconómica das famílias e a qualificação académica dos encarregados de educação (em particular das mães) continua a ser o principal preditor do sucesso escolar. Temos, no entanto, de aceitar esta predição com cautela, porque, se é verdade que existe uma relação positiva entre escolaridade das mães e sucesso escolar, não deixa de constituir mais um peso na responsabilidade das mulheres em tudo o que acontece de bom e/ou de mau às crianças, isentando os homens de serem envolvidos nestes processos. Talvez seja tema para um outro debate.
Observa-se, pois, que o sucesso educativo ainda depende mais de condições que são externas aos alunos do que propriamente do seu esforço e empenho, contrariando as teses (maioritariamente de direita) assentes na meritocracia.
Ao cumprimento dos objetivos da escola inclusiva, que também forma cidadãos, não é indiferente a dimensão curricular. Debates recorrentes sobre a educação para a cidadania, sobre a presença de diversos temas no currículo, apagam o papel da escola como promotora de participação cívica, como espaço de eficácia na prevenção de formas de exclusão e na promoção de estilos de vida e de interação social saudáveis e seguros.
A nível global, estes são temas que se debatem, nas mais variadas organizações internacionais, sobre como concretizar a função de preservação da qualidade das democracias que é entregue à escola:
- Qual o papel da escola na promoção da cidadania e da liberdade?” Que papel pode ter a educação para a cidadania para este fim?”
- Como pensar a promoção de educação plena, de responsabilidade dos serviços públicos, desde os 0 anos até à formação ao longo da vida?
- Qual a melhor organização curricular para que a liberdade e a cidadania possam ser plenamente atingidas? Que papel pode e deve ter a educação para a cidadania para este fim?
- Que colaborações intersectoriais entre diferentes esferas dos serviços públicos são necessárias para converter os sistemas educativos em apostas na prevenção e não na remediação?
- Que modelos/intenções na formação de professores que reforcem a educação para a cidadania democrática?
Objetivos
Debate abrangente que promova reflexão sobre a relação entre escola pública, equidade/inclusão e cidadania envolvendo vozes de diferentes espectros ideológicos.
Esta primeira iniciativa será posteriormente desdobrada noutros locais e num formato mais pequeno, recuperando as temáticas aqui lançadas. Prevê-se para já a realização de uma sessão no Porto.
Organização
Este debate organiza-se em torno de 3 painéis de discussão com objetivos distintos e complementares:
- Equidade e o papel da educação na promoção da inclusão e no desenvolvimento da cidadania democrática
- A colaboração intersectorial como chave para a construção da escola inclusiva
- A escola pública em 50 anos de democracia e a importância da formação de profissionais para a escola democrática
Objetivos e linhas orientadoras de cada painel
Painel 1
Equidade e o papel da educação na promoção da inclusão e no desenvolvimento da cidadania democrática
- De que forma o currículo se constitui instrumento de promoção da equidade, da consciência democrática e dos valores constitucionais.
- As razões que subjazem a uma visão de escola que deixa de fora a educação para a cidadania e estratégias para a afirmação da centralidade desta componente curricular para o cumprimento da Lei de Bases do Sistema Educativo e da Constituição.
- O contexto internacional em torno deste debate e o papel da cidadania na implementação de políticas de educação inclusiva.
- A experiência concreta de vivência da cidadania em escolas públicas que a promovem, com particular ênfase na relevância da participação dos estudantes.
Painel 2
A colaboração intersectorial como chave para a construção da escola inclusiva
- uma escola inclusiva é o primeiro passo para uma sociedade inclusiva, daí a necessária colaboração intersectorial entre diferentes esferas dos serviços públicos, com um papel fundamental na promoção de estilos de vida e de interação social saudáveis e seguros;
- como pode esta colaboração contribuir para converter os sistemas educativos em apostas na prevenção e não na remediação.
Painel 3
A escola pública em 50 anos de democracia e a importância da formação de profissionais para a escola democrática
i) fazer um balanço sobre o que se conseguiu em 50 anos de democracia relativamente à valorização profissional dos profissionais da educação, considerando o caminho relativo à aposta na respetiva formação;
ii) discutir a importância da formação de profissionais da educação, também enquanto agentes promotores da democracia em contexto educativo, ou seja, discutir a necessidade de valorizar outras componentes de formação para além dos conhecimentos técnico-científicos e didáticos. Como é que os currículos de formação – inicial e contínua -, contemplam de forma sistemática e explícita esta relação entre regime democrático e educação e como se desenvolvem competências/práticas docentes que facilitem a aprendizagem, por parte dos alunos, das regras da convivência democrática, da participação e da cidadania.
Programa completo
Manhã
10:00 – Acolhimento e Introdução ao Seminário: Causa Pública
10:15 – 11:30 – Equidade e o papel da educação na promoção da inclusão e no desenvolvimento da cidadania democrática (igualdade de género; multiculturalismo; educação sexual)
Moderação: João Costa_Agência Europeia para as Necessidades Especiais e a Educação Inclusiva
Luís Gonçalves_Professor e membro da equipa que elaborou a ENEC
Sofia Almeida Santos – CIIE/FPCEUP, e membro da equipa ENEC
Pedro Marques Lopes – Comentador político
Debate
11:45 –12:45 – A colaboração intersectorial como chave para a construção da escola inclusiva
Moderação: Duarte Vilar_Sociólogo; Diretor do Centro Lusíada de Investigação em Serviço Social e Intervenção Social – CLISIS
Margarida Gaspar de Matos_Investigadora na área da saúde
António Brito Guterres_Sociólogo
Clara Sottomayor_Jurista
Inês Castro_Professora
Almoço – 13:15-14:30
Tarde
14:30 – 15:30 – A escola pública em 50 anos de democracia e a importância da formação de profissionais para a escola democrática
Moderação: Cristina Gomes da Silva_Escola Superior de Educação_Instituto Politécnico de Setúbal
Isabel Flores_ISCTE
Rui Trindade_CCPFC_UMinho
Debate
16:00 – Síntese do seminário e perspetivas de futuro: David Rodrigues_Universidade de Lisboa
Local: Escola Secundária D. Pedro V_Sete Rios, Lisboa
Data: 5 de abril
Hora: 10:00-17:00